2004-10-08

"Palavras de Abandono"

Quantas palavras tenho de usar?

Quantas terei de vestir para falar de ti?

Parecem-me já tantas e mal iniciei.
Vi-te hoje, como numa visão.
Acabava o meu mundo, mas surgias tu.
Não sei se haveria ainda espaço ou tempo para te amar.
Só que tudo acabava, incendiado e retorcido.
Queimando talvez em agonia final.
Acabava.
Tudo, em mim.
Mas havias tu.
Palavras?
Que palavras?
Verbos, predicados, sujeitos, adjectivos?

Chamar-te anjo escondido, da amantíssima despedida de beijo fosforescente e final?

Tantas, tantas palavras…

Pudera eu desenhar-te e talvez assim fosse mais fácil.
Mas não, de certeza falharia nas cores, morrão mata morrão, como agora falho nas palavras, tantas, rodos.

E tu és só uma.

Esperança?

Angelical?

Tudo já possuído por tantos antes de nós…

Talvez apenas teu nome.
Sim teu nome.

Mas não o sei ainda, não mo disseste.
Talvez dentro em breve, sim dentro em breve, anjo, meu amor, esperança final, emulsão de luz negra…

Talvez dentro em breve mo digas.
Talvez a visão continue, como pesadelo salgado, retorcido em tons amorfos, mas quentes.

Talvez to ouça em brado, grito liberto no meu momento final. Para que te recorde, no fim.
Para que recorde que todo o fim é um começo.

Por isso não há fim, nem começo.

Existes tu.

E eu existo apenas para ouvir-te pronunciar essa única palavra.

Abandono…