2005-03-22

"Chorar"

Não sei chorar, apenas sei verter gotas de sangue.
E abandono-me nessa maldição.
Sangue roxo e salgado, filho impuro nascido dentro de mim.
Emoção sufocada, perdida de amaldiçoada.

Apenas verter.
Cheiro a morto.
Naftalina e camomila.
Chás de descanso eterno.

Abandono em fossa de sangue enlameado.
Negro piche em estrada rumo ao Oceano.
Mágoas roxas, púrpuras, magentas palavras, punhais frios.
Dilacerados olhos em lágrimas.

Cegos céus rubi.

Terra molhada, perdida bênção numa noite que não vai parir dia.

"Dourado"

Meu anjo é dourado, como no filme.
Meu anjo em cachos de abandonos subtis, franjas avant garde.
Em abandonos insanos, meu anjo me remete.
Em abandonos insanos meu anjo me proteje, como no filme.

Que morro sem ter tido oportunidade de tocar seu rosto.
Implacável essa língua de fogo, essa mão medrosa e suada.
Coragem, dourada, sorvida em fogo num copo de gargalo largo.

E gelo. Muito gelo.
Derretido em sarjetas de onde não vemos as estrelas.
Derretido em fossas sujas onde nunca chegaram as fragrâncias da moda.

E gelo. Muito gelo.
Íris cega.
Abandonos eternos…
Nunca se é de ninguém…

Casa é sempre o momento do abandono, antes do abrir do pára-quedas.
Casa é o espaço onde me afogo quando voo sereno, no céu sobredotado de intrigas.

Casa está plena de furos.
Película imperfeita, céu esvoaçado de estrelas mais loucas que eu próprio.

"Setas"

Setas em fogo, traçam errados trilhos rumo a essa carne já fétida de perdida.
Não lhe chamem futuro.
Abnegado odor a carne queimada.

Setas em fogo, tracejantes.
Vitória sem moral, sem estratégia, politica de mundo imundo.

Chamem-lhe casa, carro, barco, férias, dvd’s, filmes de muitos artistas…

Setas, a arder.
Sangue podre, em bolsa imunda.
Alma vazia de sentido e direcção.

Empate com sabor a vitória, chamem-lhe amoral.
Empate moral.
Amoral.

Ninguém sobrevive.
Setas em fogo.
A arder.

Chamem-lhe país, cidade, lugrebe.

Cidade de anjos, a música que me embriaga, travo a Bacardi Gold, quente terra ao Sul.
Praias, os desertos, os contentamentos.

Setas esfarrapadas em labaredas.

Que arda o futuro se não morrer já no presente!

2005-03-15

"Acreditar"

Acreditar?
Politica?
Alma?

Gotas de orvalho frias.

Acreditas na tristeza.
Tristezas, (muitas) dizes.
Cinza ao vento.

Eu acredito mais na poesia.
Na utopia.
Nas mil cores.
Estados de fantasia.
Acredito em ti.
Dia, noite.
Sorriso de estrela em desenho de lua.
Amiga.
No brilho desse olhar todo o futuro.
Abraço rubi embriagante.

Só na poesia tenho fé.
Já lhe chamei lábios.
Já lhe chamei umbigo.
Já lhe toquei em fogo, laranja de mil labaredas em suor, consumindo todo o ar desse quarto exíguo, perto do céu.
Sótão.

Só na poesia tenho fé.
Sumo.
Já lhe chamei saliva.

Só em ti religião.
Ámen